quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Caber.


Já não caibo mais em mim. Estou transbordando de dentro de mim mesma. Minhas roupas apertadas, agora se rasgam, deixando exposta a minha nudez.  
Não cabem dentro da minha boca, todas as palavras que querem ser ditas. Não cabe dentro das palavras, toda a tristeza que deveria ser proclamada. Não cabe dentro da tristeza, toda a culpa de não ser a única causadora do meu assombro. Não cabe dentro da culpa, o fardo pesado sustentado pelos meus ombros. Não cabe dentro do fardo todo o peso do meu coração. Não cabem dentro do meu coração toda a amargura e solidão, que por não caberem, se esparramam por todo o meu peito. Não cabe dentro do peito tamanha dor que aflige minha alma. Não cabe dentro da alma tamanho torpor que envolve o meu espírito. E não cabe dentro do meu espírito o meu corpo. E não cabem dentro do meu corpo a minha boca, as palavras, nem a tristeza, a culpa ou o fardo pesado. E não cabem dentro do meu corpo o meu coração, a amargura, a solidão, a minha alma. E não cabe dentro do meu corpo, o meu espírito. Já não caibo mais em mim.
E principalmente, não cabe dentro dos meus olhos, a expressão líquida de tudo o que sou, e de tudo que faz parte do que sou. E mesmo assim, são eles – meus olhos – que se encarregam de esparramar para o mundo tudo que transborda de mim, até que eu venha a não caber mais dentro do mundo.